quarta-feira, 19 de julho de 2006

Com sentir

Por Gustavo de Castro e Silva

Penetrar um olhar tardio em todas as coisas
para contemplar em tarde seres
o poente de cada um.
Ver que a imagem é o silêncio que fala,
na fala muda das cores
e admirar o movimento mínimo
para fazer tai chi no chão.
Captar a chuva que se expressa em haikais,
goteja versos do alto, cai que cai um calmo canto,
pingos e ais, filamentos de céus e prantos.
Ler o livro da alma e aprender a soletrar o íntimo texto,
degravar ao escrever.
Observar a pele ao sol, e ao sol, clorofilar-se.
Passear por si mesmo: animar-se, colibrir-se,
passarinhar-se, aninhar-se de céu a esmo.

Os olhos andam assim, pela vida descalços,
tateiam tudo com toques calejados
ao encalço dos cegos.

terça-feira, 18 de julho de 2006

Fernando Pessoa, sempre...

"Pois que dure, ou que, durando,
volta, neste confuso mundo obramos,
e o mesmo útil para nós perdemos
conosco, cedo, cedo

O prazer do momento anteponhamos
à absurda cura do futuro, cuja
certeza única é o mal presente
com que o seu bem compramos.

Amanhã não existe. Meu somente
é o momento, eu só quem existe
neste instante, que pode o derradeiro
ser de quem finjo ser?"

Poema de Fernando Pessoa, deixada por Emília Miranda como presente, para o meu momento, creio...