quinta-feira, 12 de janeiro de 2006

Passagem da felicidade

A felicidade passou há pouco
na sala, seu calor
ainda molda a almofada
seu cheiro de animal selvagem
me queimou as narinas

A felicidade saiu sem bater a porta
levou duas notas do velho piano
entortou alguns quadros
pendurados no corredor

Pensei em correr
e tocar seus ombros
mas na rua, ela se dispersara
em milhões de fragmentos

Fiquei como estou
quieto como quem compra
um leite vencido
e já é tarde
para não bebê-lo
de tantas fomes
sem datas

segunda-feira, 9 de janeiro de 2006

Confissão

Samarone Lima

E por último direi
Que a vida não me ensinou
Nada

O que aprendi foi por fora
Nas horas em que algo em mim
Morria
Horas em que não havia tempo
Para contar palavras

O que sei veio de algo seco e
Da ardência que o coração burlou
Dos ventos resignados pelas más lembranças

O que vier a ser aprendizado
Em mim tocará precocemente
Como chuvas anunciadas e desmerecidas
Chuvas que começam sempre
Amanhã

Aprenderei como quem caminha
Por calçadas que são meio fio
Cheias de erro e esboço

E no silêncio da vida já não pensada
Entorpecido pela imagem da taça vazia
Encontrarei a casa ao meu lado
Como se a morada coubesse finalmente em mim
Em minhas mãos vazias

Cajón Del Maipo, Chile, deciembre/1999