quarta-feira, 20 de setembro de 2006

Sangrar

Sangrar não é tudo
Muito antes, o soluço
Corrompe o céu
Blasfema no corpo
As derrotas, o ranger
Dos ferros.

Sangrar não é nada
É líquido que se perde
nos desvãos

Muito antes, a lágrima
Seca o corpo
Não deixa sequer
Umidade nas dobras
(por isso o homem range)

Sangrar não é tudo
Um dia, o corpo coagula
E sem nada nas carnes
O homem ainda canta.

Por Samarone Lima
Poço da Panela, 12.09.2006

segunda-feira, 18 de setembro de 2006

Tempos

Por Samarone Lima

Houve um tempo em que a palavra
era meu cálice, meu fogo, meu pão

Hoje a palavra não é nada
é apenas salvação.

Houve um tempo em que me escondi
à procura de coisas perdidas
em gavetas que não abriam

Hoje eu não busco mais nada
fabrico gavetas cheias de saudades.

Houve um tempo dos materiais inconclusos
de minha história roçando as pirâmides
e tudo era Egito
e tudo cheirava a sândalo.

Depois encontrei um Quixote sincero numa esquina
Havia brigado com o Sancho
e protelava suas infâncias.

Houve um tempo de naufrágios,
meu peito era a soma de estampidos, jagunços
e a poeira dos tempos perdidos.

Foi neste tempo que doei meus dentes
expus o peito aos vendavais
fiz da minha face um estandarte.

E tudo seguiu repleto de diamantes
muito embora uma noite escura
e os meus ossos gravetos
onde gravei teu nome.


Para Renilde, que me cobrou poesia.