terça-feira, 18 de março de 2008

Roubos, coleções

Roubo girassóis
Coleciono quadros de Van Gogh
Estrelas, cadernos empoeirados
Fotos de famílias extintas

Coleciono sonhos, sudários, fagulhas, tempestades
Declarações de amor nunca ditas

Roubo telepatias
Recados mudos
Bilhetes molhados
Roubo mundos

Coleciono peixes nunca pescados
Barcos jamais singrados
Coisa que nunca vi

Roubo a água dos rios que secaram
Tuas lágrimas
Coleciono jasmins dentro de tuas palavras
Roubo tua saliva
Teus gritos, teu desespero
Tuas mágoas

Coleciono pedaços de minha infância
Do tamanho de um dente de leite
Homens iguais na penumbra
Desejos nunca realizados

Roubo conchas e escuto o mar
Roubo silêncios
E os implanto em meu peito
Roubo cartas que nunca chegaram
E as leio, numa fúria sem palavras

Coleciono dias
Um dentro do outro
Oito notas musicais
Plantas dentro dos meus bolsos
No lugar das chaves

Roubo vasos, no vazio do meu jardim
E o batizo meu lugar de nada

Coleciono silêncios
Palavras ao sol
Tudo o que nunca verei
Teu coração que pulsa
No meu ventrículo esquerdo

Roubo poemas para vender na feira
Aos sábados
Para trocar no ferro-velho
Aos domingos

Dois poemas por um quilo de lembranças
Três poemas por uma mesa sem uma das pernas
Quatro poemas por uma placa de rua
Que não existe sequer na lembrança


Baía Blanca, Argentina, março de 2000.

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